17 abril 2010

Aviso à navegação


Acorda um homem e sentado está ainda a meia nau 

o rebordo da cama balaustrada de barcaça é-lhe arrimo e jangada
e o lençol vela enfunada de noite naufragada.

Acorda um homem, os pés incertos e as estrelas dormentes,
acorda entre os escarpados do sono, os olhos indecisos
e o falar nublado as ideias turvas
e no resto diminuto.

Acorda um homem, a alma em naufrágio
e da passarada ei-lo  o grito esganado de madrugada.
E no convés retesado o cordame chia
e a alma dói, orça em baloiço o desejo
acorda sim e no horizonte, enfim, o arvoredo,
da alucinante ilha frondosa que será destino.

Acorda um homem errante passageiro e nauta
vindo à terra do acaso e na hora possível.

Acorda um homem na terra de ora em diante
e no horizonte móvel que é certeza
acordado já da bruma faz casa, e com o enevoado lar,
e da ondulação sonho.

Acordou um homem e em ti edifica vida
e vivê-la-ão assim entre enseadas e sol,
o corpo sedento de sal e por ele sequioso,
a alma vogando e a brisa por companhia.

Acorda um homem encharcado de céu e do mundo ressequido.
E a noite dorme e o dia dormita e o irradiante sol e tantas árvores.

Adormecerá um homem, anoitecido, passageiro fluvial em terra
com destino a uma vida sem mar.